COMO APROVEITAR PLENAMENTE A MATURIDADE

A ciência avança. A idade média do brasileiro bate recordes. Fica o desafio de como encontrar a fórmula de viver mais, aproveitando o que a vida tem a nos oferecer, que o renomado geriatra e gerontólogo Renato Maia traz com exclusividade para Sempre Jovem.

 

A procura por alternativas para prolongar a vida remonta aos tempos bíblicos. Os discípulos de Rei Davi não se conformavam em vê-lo acamado, velho e doente. Os sábios de então imaginaram uma alternativa para curar e rejuvenescer seu rei, propondo que uma jovem, bela e virgem, ficasse deitada ao lado de Davi, na expectativa de que o ar adolescente e sadio que expirasse fosse capturado pelos pulmões comprometidos do amado rei, que assim recuperaria a mocidade e a saúde perdidas. Não deu certo…

 

Nos tempos modernos, antes do desenvolvimento mais acentuado da medicina, houve quem propusesse extrato purificado de testículos de cães como fórmula antienvelhecimento, mas não existem provas de que qualquer indivíduo tenha rejuvenescido. Sendo inviável voltar atrás em nossa viagem no tempo, será possível retardar o envelhecimento e, assim, viver mais?

 

Nos últimos cem anos a expectativa de vida no Brasil dobrou. Logo é possível viver mais.

 

A genética é responsável por apenas 30% do nosso tempo potencial de vida, mas, mesmo assim, doenças que têm relação com a hereditariedade podem ser prevenidas, evitando a morte precoce. Não se deve ir ao médico apenas para anunciar que a doença chegou.

 

A atitude preventiva é essencial. Não espere o tumor de mama aparecer para assustá-la, faça mamografia. Não acredite que toda tosse seja gripe, procure um médico. Vigie a próstata, o funcionamento intestinal, e a integridade dos ossos.

 

A história de câncer de mama na família deve acender o sinal amarelo, enfatizando a necessidade da realização de mamografia anual. O câncer de intestino também tem grande potencial hereditário, advertindo os descendentes de portadores, para que realizem colonoscopia com a regularidade sugerida pelos médicos.

 

Outros 20% do nosso tempo de vida dependem das condições sociais, políticas, financeiras e das peripécias do destino, como acidentes. A mortalidade infantil é muito maior nas regiões pobres e mesmo doenças como o acidente vascular encefálico (derrame), comprometem muitos adultos ainda jovens na base da pirâmide social, enquanto na população com melhor nível socioeconômico é quase que restrita aos mais velhos. A educação precária é insuficiente pode encurtar a vida.

 

A outra metade do nosso tempo potencial de vida depende de cada um de nós; está ligada às escolhas do dia a dia.

 

Estas começam na juventude, mas têm reflexo nos anos tardios. O fumo é o exemplo mais adequado. Fumar está associado a uma série de representações para o jovem: a publicidade já sugeriu que “fumar dava charme”. As complicações do tabagismo, entretanto, ocorrem décadas depois sob a forma de doenças do coração, enfisema, câncer e envelhecimento mais acentuado da pele. O mesmo ocorre com o excesso de bebida alcoólica e a falta de atividades físicas.

 

Ser guloso não contribui para chegar aos cem anos. Para Bernard Shaw, “não existe amor mais sincero que o amor por comida”. A dieta para viver mais é surpreendentemente simples. Inclui 

frutas, verduras, peixes ou carnes magras, pouca gordura (azeite de preferência), castanhas e um cálice de vinho (para quem não tem contraindicação) em uma refeição.

 

O sedentarismo é outro inimigo da longevidade. O ideal é que a busca por da uma maturidade saudável comece antes e não depois que os anos começam a pesar. Ou seja, a pessoa deve programar-se para envelhecer e não ser tomada de surpresa pela aposentadoria.

 

Para que a solidão e o marasmo passem longe da velhice, é fundamental investir nas relações sociais, em atividades extraprofissionais e no próprio equilíbrio emocional.

 

Quem passa a maior parte da vida adulta voltado para o trabalho, tende a sentir-se inútil quando se aposenta. O que está terminantemente proibido é entregar-se ao ócio. No combate a ele, vale trabalho voluntário, ajudar nas atividades domésticas, dedicar-se ao lazer.   

 

Nós temos que ter controle sobre as próprias atividades. Isso engloba desde independência para caminhar até controle conta bancária, passando por gerenciamento da própria casa. Para preservar a memória e o raciocínio, é vital realizar atividades que demandem esforço psicológico e cognitivo, como leitura, jogos, resolução de problemas.

 

Deve-se exercitar a mente e evitar atitudes unicamente passivas: a síndrome do sofá diante da TV, a cama, o papo para o ar.

 

Cada um que escolha entre ser um poço d’água estagnado ou um riacho que corre alegre. Viver mais depende de uma questão determinante: a vontade.

 

Para manter-se independente durante o envelhecimento, o ideal é preservar aspectos como locomoção, visão, audição e cognição. Só merece vida longa quem gosta da vida e para quem ela faz sentido. Não vale a pena viver por viver. 

 

O sentido da vida é individual, mas tem que estar na alma, deve ser a justificativa para sair da cama e procurar a luz que iluminará nossos dias. É se fazer necessário, não um entulho; merecer ser ouvido, não esquecido. Mas atenção: não adianta investir na saúde perfeita e terminar seus anos só.

 

Valorizar a casa cheia, saber perdoar, reconhecer que a vida não é um mar de rosas e enfrentar a adversidade. Esta última virtude é a resiliência: a capacidade de reagir a desafios ambientais, emocionais ou orgânicos é cada vez mais reconhecida como um dos principais ingredientes da receita da vida longa.

 

Até mesmo os netos podem “turbinar” a vida. Luís Fernando Veríssimo (O Estado de S. Paulo,23/5/2013) descreve o papo de vovô. Ele afirma que sua neta vive distribuindo papéis nas suas brincadeiras de faz de contas. “Você um minuto é pai, no outro é caçador e no outro é monstro, e pode passar de rei a cachorro. Uma das minhas encarnações é a de marido. Já nos casamos várias vezes, e como marido tenho um direito que nenhum outro personagem tem, nem o cachorro: o de ser chamado de meu amor. É o meu papel preferido. “A felicidade, assim como a beleza da natureza, pode estar nas pequenas coisas. Como explicar a presença de tantos Seniores pobres, se a pobreza pode abreviar anos de vida? A explicação é que eles são resilientes. Viver nas favelas do Rio de Janeiro não deve ser fácil, mas o sorriso e a alegria das integrantes da ala das baianas das escolas de samba demonstram que a vida pode ser longa, feliz e boa mesmo fora do conforto e da riqueza.

 

Viver mais demanda gostar da vida e dar a ela um significado. Prudência em relação à saúde. Viver em harmonia com as pessoas e com o meio ambiente. Buscar a alegria, valorizar o sorriso e poder gabar-se, assim como Pablo Neruda, que já sênior declarou: confesso que vivi!

 

Fonte:

Renato Maia Guimarães MD,MSc – Coordenador de Educação Permanente e Pesquisa em Saúde do Idoso. Escola Superior de Ciencias da Saúde(ESCS) Immediate PastPresident 

International Association of Gerontology and Geriatrics Membro da Academia de Medicina de Brasilia Membro da Academia de Medicina do Amazonas

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