Processo de interdição

O título deste artigo é enxuto por uma razão: não se pretende com ele elaborar densas teses jurídicas a respeito do grau de capacidade das pessoas com doença de Alzheimer. Seu objetivo é esclarecer, de forma objetiva, esse instituto assistencial e protetivo de que tanto se fala e pouco se compreende.

 

É bem verdade que a imagem da interdição na sociedade é muito pejorativa. Quando se fala em uma pessoa interditada, pensa-se logo na figura de um louco. Porém, essa ideia é totalmente equivocada.

 

A interdição nada mais é do que um instituto jurídico assistencial, o qual permite a uma pessoa que já não consegue exercer seus direitos e administrar seu patrimônio fazê-lo através de outra pessoa, sob os olhos do Poder Judiciário.

 

De maneira alguma, a interdição pode ser tratada como forma de punição, castigo ou até mesmo uma medalha de loucura com a qual se condecora nosso parente querido. É justamente o contrário. Seu caráter é assistencial, isto é, tem o objetivo de dar assistência, proteção, àquele que dela necessita, à medida que permite continuar exercendo seus direitos plenamente, como toda e qualquer pessoa. Injusto seria eliminar da sociedade a pessoa que, por conta de uma doença, perdeu sua capacidade civil.

 

Para compreender a interdição em decorrência da incapacidade provocada pela doença de Alzheimer, é preciso saber as consequências jurídicas provocadas por ela.

 

A doença de Alzheimer é causadora de incapacidade irreversível, e isso quer dizer que a pessoa com a doença, ao longo do tempo e de acordo com a evolução de seu quadro clínico, perde a capacidade de realizar as atividades racionais necessárias para o seu bem-estar e subsistência (por exemplo, tomar banho, escovar os dentes, trabalhar, andar, tomar decisões), necessitando que outras pessoas a auxiliem mesmo nas atividades mais simples do dia a dia.

 

Em geral, a doença de Alzheimer acomete, inicialmente, a parte do cérebro que controla a memória, o raciocínio e a linguagem. Entretanto, pode atingir outras regiões do cérebro, comprometendo assim outras funções.

 

Trataremos a seguir da incapacidade civil nos casos da doença de Alzheimer, já adiantando que ela pode ocorrer em razão dos lapsos de memória, confusão mental, alucinações e perda das funções motoras.

 

É justamente na fase da doença em que a pessoa começa a apresentar lapsos de memória, confusão mental e dificuldade motora que grande número de pessoas se vê às voltas com institutos como a interdição e instrumentos como procurações, na tentativa de resolver problemas como movimentar uma conta bancária sem a assinatura do titular, fazer o recadastramento no INSS e alienar bens imóveis, e se deparam com instrumentos como procurações, interdição, curatela, doação, usufruto e testamento.

 

Em geral, os familiares e cuidadores providenciam tais soluções quando o quadro da doença de Alzheimer já está bem avançado, o que torna tudo mais complicado. O ideal seria tomar providências mesmo antes do diagnóstico da doença, logo quando começam a aparecer os primeiros sinais de alteração de comportamento (geralmente atribuídas à idade avançada), pois, nesse estágio, o próprio indivíduo pode tomar a iniciativa e realizar manobras preventivas no sentido de resguardar seu patrimônio e o de sua família, facilitar operações burocráticas, deixando um caminho iniciado a ser seguido pelas pessoas mais próximas se alguma complicação maior vier a ocorrer como a doença de Alzheimer ou outra doença incapacitante, sendo possível, inclusive, evitar o processo de interdição.

 

Nessas horas, deve-se buscar o maior número de informações corretas sobre a doença e encarar, com o máximo de frieza possível, o caminho evolutivo das pessoas que a adquirem.

 

Tenha sempre em mente que os pacientes da doença de Alzheimer evoluem para a incapacidade jurídica da pessoa e, em alguns casos, bem rapidamente.

 

A informação é a melhor arma para afastar a insegurança e o medo de procurar uma solução para os problemas.

 

 

Capacidade das pessoas

 

Para compreender todos esses termos jurídicos utilizados e acabar com as dúvidas a respeito de qual é a medida mais apropriada a ser tomada em cada momento, é preciso saber como a capacidade das pessoas é abordada na legislação brasileira.

 

A lei brasileira que trata da capacidade das pessoas é o Código Civil em seus primeiros artigos. De acordo com ele, temos duas espécies de capacidade: a capacidade de aquisição de direitos e deveres (capacidade de direito) e a de exercício de direitos (capacidade de gozo ou de fato).

 

A capacidade de aquisição de direitos está regulada no art. 1° do Código Civil, a qual é atribuída a todas as pessoas, a partir do nascimento com vida. É a capacidade que toda pessoa tem de adquirir direitos e deveres na esfera civil. Por exemplo, a todas as pessoas é assegurado o direito à vida digna, à saúde, ao trabalho, ao lazer, a manter uma conta no banco, a adquirir bens móveis e imóveis e a todos os direitos que as leis asseguram às pessoas. Esta é a mais importante e só termina com a morte.

 

Já a capacidade de fato ou de exercício consiste na aptidão para exercer, por si só, os atos da vida civil. Pelo Código Civil, a pessoa, ao completar 18 anos, adquire a capacidade plena para administrar sua pessoa e seus bens. Assim, a lei presume que todas as pessoas maiores de 18 anos são plenamente capazes de exercer seus direitos manifestando sua vontade. Esta é a chamada capacidade de exercício, de fato ou de gozo.

 

Aqueles que possuem plena capacidade de exercício de direitos são os “capazes”, e os que não a tem são os “incapazes”.

 

A incapacidade é uma restrição ao exercício pessoal dos atos da vida civil, imposta pela lei para proteger aqueles que necessitam de proteção.

 

Logo, no art. 3° do Código Civil são citadas as pessoas que ainda não possuem a capacidade plena ou que a perderam por algum motivo. Para a lei, essas pessoas não conseguem manifestar sua vontade de maneira adequada e por isso não podem exercer seus direitos sem o auxílio de outra pessoa plenamente capaz. Estas são as chamadas pessoas absolutamente incapazes e são as seguintes: os menores de 16 anos; aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil; aqueles que não podem exprimir sua vontade, mesmo por causa transitória, temporária.

 

As pessoas entre 16 e 18 anos são tidas como relativamente capazes pela nossa lei, isto quer dizer que elas conseguem exprimir sua vontade em algumas situações e, em outras, a lei vai exigir que elas sejam assistidas, auxiliadas por pessoas plenamente capazes para assegurar que sua vontade seja preservada.

 

Concluímos, portanto, que a pessoa absolutamente incapaz não consegue realizar os atos da vida civil pessoalmente, exercendo seus direitos, e, por isso, necessita de outra pessoa que os exerça em seu lugar. Afinal, ela possui direitos, isto é, a capacidade de adquirir direitos. Já a pessoa relativamente capaz consegue exprimir sua vontade e realizar os atos da vida civil, entretanto, pela lei, em regra, ainda não possui maturidade suficiente para realizá-los sem a assistência de outra pessoa.

 

Note, neste ponto, que a incapacidade não significa que a pessoa é inválida ou incapaz de fazer qualquer coisa, trata-se aqui da incapacidade jurídica apenas, sob o ponto de vista da lei. Lei esta que diferencia para proteger as pessoas que passam, por exemplo, por algum problema de saúde que as impede de sempre agir com coerência, como nos casos da doença de Alzheimer. Ou ainda no caso de um acidente qualquer, em que a pessoa perde sua consciência por certo período de tempo, entre tantos outros exemplos.

 

Vale a pena lembrar que a lentidão no raciocínio por conta da idade avançada não é causa de incapacidade. Uma pessoa pode ter 95 anos e ser lúcida, pensar e agir com coerência, manifestar sua vontade de forma livre, sendo, dessa maneira, plenamente capaz. Já uma pessoa com a doença de Alzheimer, ao evoluir para estágio em que são frequentes os lapsos de memória e a confusão mental, torna-se incapaz juridicamente, e, apesar de poder fazer atividades rotineiras, não apresenta condições de administrar seu patrimônio, por exemplo, de maneira satisfatória e justa aos olhos da sociedade.

 

Assim, para a nossa legislação, os efeitos decorrentes da doença de Alzheimer tornam a pessoa impossibilitada de cuidar dos próprios interesses, sendo, dessa forma, absolutamente incapaz.

 

Para cuidar dos interesses de uma pessoa absolutamente incapaz, a lei criou a figura do curador, que exercerá o encargo de administração e gestão dos direitos e do patrimônio da pessoa incapacitada.

 

 

O curador

 

O curador, de acordo com o que vimos, é a pessoa responsável pela prática dos atos da vida civil do curatelado (pessoa que foi interditada), em seu lugar. O curatelado, no nosso caso, é a pessoa absolutamente incapaz, o paciente de doença de Alzheimer. Note que, sem a figura do curador, a pessoa absolutamente incapaz não seria capaz de exercer seus direitos e, nesse caso, ocorreria uma situação de extrema injustiça.

 

Portanto, a curatela é instituto protetivo e assistencial. É a única maneira de a pessoa que não consegue mais zelar pelos seus próprios interesses reger sua vida, administrar seu patrimônio, exercer seus direitos e “tornar-se capaz novamente” perante a sociedade.

 

Por esse caminho, ficará fácil entender que a curatela pode ser retirada a qualquer tempo, já que o instituto visa à proteção da pessoa incapaz e, à medida que esta recobrar sua higidez mental, a figura do curador não será mais necessária.

 

O caráter protetivo da curatela fica muito claro no art. 1.590 do Código Civil, no qual é conferido aos maiores incapazes os mesmos direitos que os filhos menores possuem com relação à guarda e à prestação de alimentos.

 

Pode, por exemplo, o curador ter reconhecida a condição do curatelado como seu dependente para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários e fazendários. Mesmo porque, na maioria das vezes, o curatelado não possui rendimentos suficientes para custear seu sustento, o que onera o curador. Por exemplo, o curatelado pode figurar como dependente do curador na declaração do Imposto de Renda, e o curatelado pode receber pensão do INSS no caso de morte do curador.

 

O Código Civil, em seu art.1.767, aponta as pessoas que estão sujeitas à curatela e entre elas temos a pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiver o necessário discernimento para os atos da vida civil ou quem, por outra causa duradoura, não puder exprimir sua vontade. Fica claro aqui que não é preciso o diagnóstico de uma doença para que a pessoa possa ter um curador, basta apenas que ela não consiga expressar sua vontade de maneira adequada, pouco importando a causa.

 

 

 

Interdição

É através da ação de interdição que a pessoa é declarada incapaz e um curador é nomeado pelo juiz da Vara da Família para gerir seus interesses.

 

A interdição é um processo judicial para o qual a pessoa necessitará contratar um advogado para promovê-la. Entretanto, caso não tenha condições financeiras de arcar com os honorários de um advogado, poderá procurar a assistência judiciária gratuita mais próxima de seu domicílio (OAB, faculdades de direito que mantenham escritório experimental, PAJ etc.), a Defensoria Pública e, em alguns casos, o Ministério Público.

 

O grau de incapacidade (se incapacidade absoluta, capacidade plena ou relativa) é definido na perícia médica: o médico perito indicará no laudo pericial se a pessoa é absolutamente incapaz de exercer os atos da vida civil e o juiz baseará a sentença da ação de interdição nesse laudo.

 

Portanto, quem pode dizer com propriedade a hora exata em que a pessoa poderá ser interditada é o médico, e não o advogado. Ao advogado compete analisar se a ação de interdição terá utilidade concreta, orientando a família na tomada de decisões, e conduzir o processo de interdição do incapaz e nomeação de um curador.

 

 

Notas importantes

 

  1. O estado de alienação, por si só, não enseja a incapacitação.
  2. O que importa realmente saber é se existe causa incapacitante e, caso positivo, em que grau de extensão ela compromete os atos da vida civil e se impossibilita a administração de negócios e a gestão do patrimônio.
  3. A simples idade avançada não é motivo para interdição.
  4. O mero enfraquecimento psíquico é expressão de normalidade própria da idade e não configura alteração mental.
  5. A demência senil autoriza a interdição.
  6. A interdição é possível em qualquer fase da doença de Alzheimer, inclusive antes de seu diagnóstico. Se não apresentar condições físicas ou mentais para administrar seus negócios e gerir seu patrimônio de maneira adequada, a pessoa poderá ser interditada.

 

Espero que tenha ficado claro que o motivo para a interdição não é a existência da doença de Alzheimer, mas sim o grau de incapacidade apresentado pela pessoa. O que ocorre é ser a doença de Alzheimer, na grande maioria das vezes, um indicativo de que a pessoa perdeu sua capacidade em decorrência de esta ser uma doença incapacitante, por isso todo o esforço na colheita de provas do diagnóstico da doença para instrução do processo de interdição.

 

Esse fato também explica a necessidade da perícia médica judicial. Os laudos médicos, por mais completos que sejam, na maioria das vezes não atestam o grau de capacidade do paciente, apontando apenas e tão somente a existência da doença de Alzheimer, o que, já vimos, não é causa determinante da interdição da pessoa.

 

 

Quem pode fazer o pedido de interdição?

 

O Código Civil também determina quais são as pessoas que poderão ajuizar a ação de interdição, isto é, dar entrada ao processo. Trata-se de uma relação de parentes próximos que podem ajuizar a ação todos em conjunto, dois deles, ou apenas um sozinho.

 

São legitimados para requerer a interdição:

 

  1. a) Pais ou tutores.
  2. b) Cônjuge (mesmo que separados) ou parente (filhos, irmãos, tios, primos, avós, bisavós). Obs.: muito embora não conste o companheiro na relação de pessoas do Código Civil, a este também é reconhecido o direito de ajuizar a ação de interdição.
  3. c) Ministério Público (apenas nos casos de doença mental grave, ou se as demais pessoas autorizadas não existirem ou não formularem o pedido de interdição, ou se estas também forem incapazes).

 

 

Atenção

 

O dirigente de uma clínica de saúde ou entidade assistencial não pode dar início a uma ação de interdição. Nesse caso, a necessidade de interdição deve ser noticiada ao Ministério Público, que tomará as providências necessárias. No entanto, uma pessoa ligada à entidade assistencial que estiver acolhendo o incapaz poderá ser nomeada curadora do interditado.

 

A própria pessoa enferma poderá requerer que lhe seja nomeado um curador para cuidar de todos ou de alguns de seus negócios ou bens (curatela de menor extensão). Sendo possível tal medida muito no início da doença de Alzheimer, se o paciente tiver consciência da doença e de sua extensão futura. Porém, nesses casos, é mais comum que a pessoa outorgue uma procuração para que alguém atenda aos seus interesses.

 

 

Quem pode ser nomeado curador?

 

O Código Civil, no art. 1.775, estabelece a ordem de nomeação do curador entre os parentes do interditando. Esta ordem não é rígida, mas deve ser respeitada na medida do possível, não sendo obrigatória a sua obediência, devendo, antes de tudo, ser resguardados os interesses do incapaz:

 

1º – O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato.

2º – O pai ou a mãe.

3º – O descendente que se demonstrar mais apto, sendo que os mais próximos precedem aos mais remotos.

4º – Na falta das pessoas mencionadas, compete ao juiz a escolha do curador.

 

 

Curatela compartilhada

 

Existe, ainda a curatela compartilhada, isto é, a nomeação de mais de um curador. Ocorre apenas em casos raríssimos em que tal medida melhor atenda aos interesses do curatelado. Da mesma maneira que a lei não prevê expressamente tal figura, ela também não a proíbe, bastando ter uma razão bem convincente que a justifique.

 

 

Quem não pode ser nomeado curador?

 

O art.1.735 aponta as pessoas que não poderão ser nomeadas como curadores:

 

  • aqueles que não tiverem a livre administração de seus bens;
  • aqueles que, no momento de lhes ser deferida a tutela, se acharem constituídos em obrigação para com o interditando, ou tiverem que fazer valer direitos contra este, e aqueles cujos pais, filhos ou cônjuges tiverem processo contra o interditando;
  • os inimigos do interditando, ou de seus pais, ou que tiverem sido expressamente excluídos da curatela;
  • os condenados por crime de furto, roubo, estelionato, falsidade, contra a família ou os costumes, tenham ou não cumprido a pena;
  • as pessoas de mau procedimento, ou falhas em probidade, e as culpadas de abuso em tutorias/curatelas anteriores;
  • aqueles que exercem função pública incompatível com a boa administração da tutela.

 

 

Quem pode recusar a nomeação de curador?

 

No caso de uma pessoa ter sido nomeada curadora de outra e não quiser assumir o encargo, esta poderá recusar a nomeação nos casos do art.1.736 do Código Civil:

 

  • se for mulher casada;
  • se for maior de 60 anos;
  • aquele que tiver sob sua autoridade mais de três filhos;
  • o impossibilitado por enfermidade;
  • aquele que habitar longe do lugar onde se haja de exercer a curatela;
  • aquele que já exerce a curatela ou tutela;
  • os militares em serviço;
  • quem não for parente do interditando não poderá ser obrigado a aceitar a curatela, se houver no lugar parente idôneo, consanguíneo ou afim, em condições de exercê-la.

 

Se alguma dessas causas ocorrer durante o exercício da curatela, o curador poderá requerer a nomeação de outro curador e a extinção de seu encargo após a prestação de contas.

 

 

Responsabilidade do curador

 

A forma mais clara de explicar como se dá o exercício da curatela é listando as atividades que passam a ser de responsabilidade do curador, são elas:

 

  • cabe ao curador a administração dos bens do curatelado, em proveito deste, cumprindo seus deveres com zelo e boa-fé, representando-o nos atos da vida civil;
  • incumbe ao curador defender o curatelado e prestar-lhe alimentos, conforme os seus haveres e condição;
  • o curador deverá receber as pensões, as rendas e as quantias devidas ao curatelado;
  • deverá o curador cuidar das despesas de subsistência do curatelado, bem como as de administração, conservação e melhoramento de seus bens;
  • compete ao curador alienar os bens do curatelado e promover o arrendamento dos bens de raiz, mediante preço conveniente;
  • é cabível a nomeação pelo juiz de um procurador (pró-tutor) para a fiscalização dos atos do curador, sendo possível módica retribuição, sendo este responsável solidário por eventuais prejuízos causados pela má administração do curador;
  • se os bens e interesses administrativos exigirem conhecimentos técnicos, forem complexos, ou realizados em lugares distantes do domicílio do tutor, poderá este, mediante aprovação judicial, delegar a outras pessoas físicas ou jurídicas o exercício parcial da tutela;
  • o curador tem direito, se desejar, à remuneração proporcional à importância dos bens administrados;
  • o curador tem direito de ser reembolsado pelo que realmente gastar durante a curatela, salvo encargos assumidos gratuitamente;
  • o curador responderá por prejuízos que causar ao curatelado por dolo ou culpa;
  • os curadores não podem conservar em seu poder dinheiro dos curatelados, além do necessário para as despesas comuns com o seu sustento, a sua educação e a administração de seus bens;
  • o curador não pode vender os bens móveis de valor expressivo, como joias, ouro e prata, sem autorização judicial e, em caso de necessidade, o mesmo se aplica aos bens imóveis;
  • a autoridade do curador estende-se à pessoa e aos bens do curatelado, bem como aos filhos, nascidos ou ainda nascituros, além de todos os encargos que lhe são atribuídos;
  • havendo meio de recuperar o interdito, o curador promover-lhe-á o tratamento em estabelecimento apropriado;
  • quando o interdito não se adaptar ao convívio doméstico, pode ser recolhido a estabelecimento adequado;
  • o curador deverá, ainda, prestar contas de sua administração. Para alguns atos, o curador precisará de autorização judicial. São eles:
    • pagamento de dívidas do curatelado;
    • aceitação de herança, legado, doação, ainda que com encargos;
    • firmar acordos;
    • vender bens imóveis cuja conservação não convier, e os imóveis no caso em que for permitido;
    • propor ações em juízo ou defender o curatelado nas que vier a ser demandado.

 

O curador não poderá, ainda que o juiz autorize:

 

  • adquirir, para si, bens do curatelado;
  • dispor de bens do curatelado a título gratuito;
  • constituir-se cessionário de crédito ou de direito contra o curatelado.

 

 

Prestação de contas

 

É obrigação do curador prestar contas do desempenho de sua função, já que está na posse e administração dos bens do curatelado.

 

Entretanto, o cônjuge casado sob o regime da comunhão universal de bens não está obrigado a prestar contas, salvo determinação judicial.

 

Ao final de cada ano de administração, o curador deverá apresentar ao juiz o balanço respectivo para aprovação e, a cada dois anos, deverá prestar contas de sua administração, assim também quando, por qualquer motivo, deixar o exercício da curatela, ou, ainda, quando o juiz o determinar.

 

A prestação de contas consiste na apresentação, de forma detalhada, de todos os itens de crédito e débito que resultam da administração do curador com o fim de apurar se há, ou não, saldo devedor ou credor. Ela deverá ser apresentada em forma mercantil (lançamentos de forma discriminada e em ordem cronológica), especificando-se as receitas e a aplicação das despesas (apresentação em duas colunas, uma delas referente às despesas e a outra às receitas), bem como o respectivo saldo, sendo instruída com os documentos justificativos.

 

Veja que é de interesse do curador prestar contas, pois se tiver saldo a receber só o poderá fazê-lo através desse procedimento. Comumente ocorre de o interditado não ter condições de manter a sua subsistência, cabendo ao curador prestar essa assistência, o que onera o patrimônio do credor. O curador tem direito ao recebimento dessa quantia que gasta com o sustento do curatelado, e a maneira correta de ver reconhecido tal direito é através da prestação de contas.

 

A prestação de contas pode ser proposta por quem tiver o direito de exigi-la ou a obrigação de prestá-la, podendo, assim, a ação ser de exigir contas ou de dá-las.

 

A ação exigindo a prestação de contas só é cabível caso o curador negue a prestação das contas quando for obrigado a fazê-lo, ou, então, quando o curador quiser prestá-las e a parte contrária não as aceitar.

 

Pode exigir a prestação de contas aquele que teve seus bens ou negócios administrados ou geridos por outra pessoa e pretende que ele preste as contas de sua gestão. No caso da ação de interdição, esta seria de encargo do pró-tutor.

 

O curador poderá prestar contas extrajudicialmente ao pró-tutor. As contas do curador serão apresentadas no próprio processo de interdição. Caso seja apurado saldo devedor, hipótese em que deverá pagar quantia ao curatelado, o curador deverá quitar sua dívida no prazo fixado pelo juiz, sob pena de ser destituído do encargo e ter os bens sob sua guarda sequestrados, sendo descontada de eventual quantia que tenha a receber.

 

 

Processo de interdição

 

Como já dito anteriormente, o processo de interdição é o meio adequado para obter a declaração de incapacidade absoluta ou relativa da pessoa que está privada, total ou parcialmente, de seu discernimento e da aptidão de exprimir livremente sua vontade. Trata-se de processo judicial, em que a atuação de um advogado é obrigatória, e será aforado perante uma Vara da Família, no foro do domicílio do interditando.

 

O interessado na curatela deve provar a relação de parentesco com o interditando através de documentos escritos, tais como Identidade (RG), Certidão de Nascimento, Certidão de Casamento, dentre outros. E deverá indicar os fatos pelos quais está pedindo a interdição de seu parente, especificando aqueles que demonstram a incapacidade do interditando, como o fato de ele não mais conseguir gerir seus negócios e administrar seus bens, não conseguir mais exprimir sua vontade, apresentar confusão mental e necessitar do auxílio de uma terceira pessoa para praticar os atos da vida civil.

 

A manifestação do órgão do Ministério Público, através do Promotor de Justiça, é obrigatória e sua função é a de defender os interesses do incapaz, isto é, buscar o melhor para ele.

 

São eventos significativos dentro do processo de interdição:

 

Audiência e defesa: em que o interditando comparece ao Fórum para que o juiz possa conhecê-lo. Nessa ocasião, o juiz avaliará o interditando através de perguntas, buscando extrair impressões a respeito de seu discernimento, capacidade e aptidão para gerir seus negócios.

 

Mesmo que o interditando não fale, ou não consiga responder às perguntas de forma adequada, o ato é proveitoso, pois esse comportamento, bem comum dos pacientes com doença de Alzheimer, é indicativo de que a pessoa não está apta para praticar os atos da vida civil sem o auxílio de terceira pessoa.

 

As perguntas elaboradas são a respeito da vida do interditando, seus negócios, seus bens, seus interesses, suas atividades rotineiras e sobre o que mais o juiz entender pertinente para que ele extraia uma impressão a respeito da pessoa que ele está ouvindo. O Ministério Público também participa dessa audiência.

 

Caso o interditando não possa se deslocar até o fórum por algum motivo, o juiz, o promotor de justiça e o escrivão irão ao local em que ele esteja, e lá realizarão o interrogatório. Interrogatório é apenas o ato processual em que uma autoridade, no nosso caso o juiz, dirige perguntas a uma pessoa. Não se trata do interrogatório que todos já ouvimos falar, o interrogatório policial, feito na delegacia e que não se assemelha em seu teor e objetivo com o interrogatório do interditando.

 

É bem verdade que a audiência pode ser dispensada, mas somente em casos extremados e muito raros, em que a não realização não prejudique o interditando. Todos os atos são no sentido de sua proteção e em razão do seu interesse.

 

É importante lembrar que a interdição não é utilizada apenas em casos de pessoa com a doença de Alzheimer, mas o mesmo procedimento é aplicado para todos os casos de incapacidade. Pessoas mal-intencionadas podem se utilizar desse procedimento fraudulentamente para, por exemplo, afastar uma pessoa de seus negócios. Daí porque é dada a oportunidade do interditando defender-se, caso queira, em momento anterior ou posterior (o mais comum) a essa audiência, através da apresentação de defesa escrita por advogado, o qual pode ser constituído pelo próprio interditando ou algum parente próximo.

 

Perícia: este ato é de extrema importância, por tal motivo será tratado no próximo tópico.

 

Julgamento: é o momento em que o juiz expressará seu entendimento a respeito do caso através da sentença. Se procedente o pedido, na sentença será declarada a incapacidade do interditado e um curador será nomeado.

 

A sentença fixa, inclusive, os limites da curatela. Após, será publicada em jornal por três vezes e depois será registrada no Cartório de Registro de Pessoas Naturais, de onde será extraída uma certidão, que será o novo documento de identidade do interditando (agora interditado). Cumpre informar que dessa sentença caberá recurso.

 

É importante dizer que, cessada a causa motivadora da interdição, será requerido o seu levantamento e a pessoa volta a ter capacidade plena. Vamos supor que a cura da doença de Alzheimer tenha sido descoberta e que a pessoa doente, já interditada, recebeu o tratamento recobrando sua consciência e ela está, portanto, apta para administrar sua vida. Nesse caso, a interdição poderá ser levantada através de um pedido no próprio processo. De modo que o processo de interdição somente termina com a morte do interditado ou com a cessação da causa que determinou a medida.

 

 

Perícia

 

A perícia é o meio de prova destinado a esclarecer o juiz sobre as circunstâncias relativas aos fatos conflituosos ou que envolvem conhecimentos técnicos ou científicos.

 

A perícia médica na ação de interdição é um exame minucioso, realizado por um médico perito da confiança do juiz, a fim de, analisando a condição físico-psíquica do interditando, verificar a sua capacidade em gerir a própria vida. O interditando será examinado por esse perito, juntamente com todo o histórico evolutivo descrito nos prontuários que lhe forem apresentados, e com eventuais exames diagnósticos que tenham sido realizados e que já estejam no processo. Daí a importância de apresentá-los no momento inicial do pedido de interdição.

 

Nada impede que novos documentos sejam levados no dia da perícia.

 

Após esse exame, o médico perito elabora um laudo técnico, o que é bem diferente de um atestado médico e de uma certidão médica, e responde aos quesitos apontados pelo promotor de justiça e pelos advogados.

 

Os quesitos são perguntas elaboradas no sentido de elucidar as informações acerca da lucidez do interditando, aspectos estes nos quais o juiz irá basear sua sentença.

 

São exemplos de quesitos: o periciado pode compreender a realidade a sua volta? o periciado consegue, por si só, realizar os atos da vida civil? Qual grau de capacidade possui o periciado?

 

O laudo não pode se circunscrever a mero atestado médico em que se indique por código a doença.

 

 

A perícia é obrigatória?

 

A lei exige a realização de perícia médica em processo de interdição, sob pena de nulidade. Portanto, é obrigatória a realização do exame médico pericial para que o juiz interdite uma pessoa.

 

É obrigatório, pois o fato que enseja a interdição, isto é, a capacidade civil do indivíduo, necessita ser graduada e, para que seja graduada corretamente, necessita de avaliação de profissional com conhecimentos científicos na área médica, os quais um juiz não é obrigado a ter. Esse profissional é o perito judicial, ele é um auxiliar do juiz, com formação na área relativa ao fato que deve ser provado.

 

Mesmo que o juiz possua o conhecimento necessário para verificar o grau de capacidade do interditando, ou ainda que a incapacidade absoluta do interditando seja muito evidente, a obrigatoriedade da perícia não pode ser afastada porque a perícia tem duas funções:

 

1) Acabar com eventuais dúvidas que o juiz possa ter a respeito do fato, no nosso caso, da condição físico-psíquica do interditando (sempre lembrando que a interdição não é utilizada apenas em casos de doença de Alzheimer, podendo facilmente uma pessoa ser dopada por outra – sobretudo um idoso que receba cuidados de terceiro – no dia da audiência e em decorrência disso mostrar-se totalmente incapaz de reger sua própria vida).

 

2) Mostrar para as partes e para a sociedade a realidade do fato acontecido, que ele existe realmente e que se espelha no relatado.

 

É uma forma de criar segurança para todas as pessoas envolvidas. Por exemplo: é a garantia de que o interditando não será interditado se não apresentar comprometimento físico-psíquico que o impeça de reger sua própria vida, e o juiz não interditará inadequadamente uma pessoa sã.

 

O entendimento majoritário nos nossos tribunais é o de que se admitir a interdição de uma pessoa por mera constatação de fato, no interrogatório, por apresentar sintomas de incapacidade mental é abrir-se um precedente muito perigoso. Dizem, ainda, que muito embora um juiz se julgue apto a proferir sentença de interdição, desamparado de um laudo médico, essa conduta deve ser evitada ao máximo, pois a Medicina é um campo estranho às atividades puramente jurídicas. E sempre que estivermos diante de uma questão que exija conhecimento próprio de Medicina, é necessário o trabalho técnico de um profissional habilitado que examine a questão aos olhos da ciência adequada. E mais, o profissional deve ser da confiança do juiz: é a garantia de um trabalho idôneo e confiável.

 

 

Dispensa da perícia médica

 

Como dito anteriormente, a realização da perícia médica judicial nos casos de interdição é obrigatória sob pena de ser decretada a nulidade do processo.

 

Entretanto, é bem verdade que há histórico de dispensa desse exame em raros casos, em alguns tribunais. Tais casos, de tão raros, sempre acabam nos noticiários, como este famoso caso que pontuamos:

 

O juiz Mauricio Cavallazzi Póvoas, titular da terceira Vara da Família da Comarca de Joinville, decretou a interdição de C.C.G., portadora de déficit cognitivo e transtorno esquizotípico, sem a necessidade de realização de perícia judicial. Segundo o magistrado, o interrogatório realizado com C. deixou claro sua incapacidade de prover seu sustento ou praticar os atos inerentes à sua vida civil. Além disso, prova documental consistente em perícia extrajudicial e atestados foram anexados aos autos. Interessante frisar, neste ponto, que não obstante haver divergências doutrinárias e jurisprudenciais acerca da possibilidade de dispensa de perícia em casos de interdição, o melhor entendimento, a meu sentir, é mesmo o de tornar desnecessária a prova técnica em casos de evidente incapacidade, poupando, assim, o interditando, de mais e mais procedimentos burocráticos que somente desgastam a ele e sua família, física e mentalmente, concluiu o juiz. A representante do Ministério Público, em seu parecer, oficiou pelo acolhimento do pleito.

 

Na maioria dos casos noticiados a dispensa se deu por motivos que ocorreram em conjunto. O primeiro deles foi o estado de saúde do interditando ser tão delicado que não seria possível o comparecimento dele ao local da realização da perícia e, nesses casos, a família contratou um médico perito para elaborar um laudo pericial específico para o processo de interdição.

 

Ocorre que, mesmo contratando um perito particular para a elaboração do laudo, a parte não tem a garantia de que o juiz irá aceitá-lo. Caso não aceite, uma perícia judicial deverá ser realizada e implicará gasto extra para a família do interditando.

 

A nossa legislação tratou de exigir o exame pericial para a segurança das decisões judiciais, que não devem ser proferidas sem um parecer médico, se possível de confiança do juízo, por isso o juiz não está obrigado a aceitar um laudo médico de um profissional que não conhece, que não é de sua confiança.

 

 

Curatela provisória

 

Certamente a grande maioria das pessoas já escutou este termo: “curatela provisória”, mas do que se trata?

 

Explico. Chamamos de curatela provisória o ato de o juiz nomear um curador ao interditando antes do término do processo de interdição.

 

Como foi explicado, ao final do processo de interdição o juiz proferirá uma sentença declarando a incapacidade do interditando e nomeando um curador para administrar-lhe os negócios e os bens.

 

Todos também sabem que uma ação judicial demora muito tempo.

 

Entretanto, algumas pessoas não podem esperar até o final de um processo de interdição para que lhe seja nomeado um curador para realizar determinados negócios de extrema urgência: essa demora resulta sérios prejuízos ao interditando.

 

Como, por exemplo, uma pessoa com a doença de Alzheimer que ainda não tenha requerido sua aposentadoria junto ao INSS e que não tenha mais outra fonte de renda. Essa pessoa necessita dar entrada no pedido de aposentadoria com máxima urgência, no entanto ela não consegue mais assinar documentos. É necessário que ela seja, pois, representada por um curador perante o INSS o mais rapidamente possível. Sua família deverá ajuizar pedido de interdição e pedir para o juiz para que lhe nomeie um curador antes da sentença para que o pedido de aposentadoria possa ser concretizado perante o INSS.

 

Considerando tais fatos, a lei confere o direito à prestação da tutela antecipada, que consiste na possibilidade de o juiz decidir provisoriamente a respeito do pedido efetuado antes da sentença, tendo em vista que a proteção jurisdicional deve ser oportuna, adequada e efetiva. O processo precisa gerar resultados rapidamente quando a pessoa tem urgência de atendimento do seu pedido.

 

Para ter direito a essa proteção antecipada, a pessoa deve, no processo, além de fazer o pedido, produzir prova inequívoca das suas alegações que demonstrem ser verdade tudo aquilo que é alegado (a exemplo, nos casos de doença de Alzheimer apresentamos relatório ou laudo médico diagnosticando a doença e certificando a incapacidade da pessoa para realizar os atos da vida civil, exames realizados, receituários médicos, entre tantos outros documentos). É ainda necessário demonstrar que a espera até a prolação da sentença pode causar danos irreparáveis ou de difícil reparação à pessoa, ou que a defesa apresentada pela parte contrária só tem o propósito de aumentar o tempo de espera pela sentença, uma vez que não apresenta qualquer motivo que impeça o reconhecimento do direito do autor à tutela jurisdicional de seu pedido.

 

Dessa forma, se o interditando necessitar urgentemente de um curador e a pessoa que der entrada no pedido de interdição conseguir provar através de documentos idôneos a sua incapacidade, o pedido de antecipação da tutela (curatela provisória) poderá ser efetuado.

 

Essa decisão terá validade até a data da sentença, ou até o prazo fixado pelo juiz. Vale a pena dizer que o juiz a qualquer momento poderá “cancelar” essa nomeação se verificar que o pedido de interdição não poderá ser atendido por qualquer razão.

 

 

Procuração

 

Uma solução frequentemente utilizada por parentes de pessoas com a doença de Alzheimer é a procuração.

 

Muitas pessoas confundem seus efeitos com os efeitos da interdição, porém, os efeitos da procuração são restritos à administração patrimonial, não protegendo amplamente a pessoa que a outorga, já que não restringe sua capacidade civil.

 

Muito mais ampla, a interdição, além de declarar a incapacidade de uma pessoa, de delegar os poderes de administração patrimonial a um curador, de “entregar a guarda” do incapaz a esta terceira pessoa que a representará em todos os atos da vida civil e não só nos negociais, acaba, ainda, por proteger seu patrimônio de abusos de quaisquer pessoas, inclusive os próprios abusos do interditado.

 

Para todos os efeitos é melhor que entendamos o que é uma procuração e todos os detalhes que a cercam.

 

 

O que é uma procuração?

 

A procuração é a forma instrumentalizada, isto é, um documento escrito, representativo de um contrato de mandato. Esse contrato é tratado como uma espécie diferenciada pelo Código Civil.

 

O contrato de mandato vem regulado nos art. 653 até 692 do Código Civil. Trata-se de contrato de representação para a realização de um negócio jurídico pelo qual alguém (mandante, outorgante, a pessoa que passa a procuração) transfere poderes a outra pessoa (mandatário, outorgado, procurador) para que este, em seu nome, pratique atos ou administre interesses.

 

A procuração é o instrumento, documento físico, representativo de que duas pessoas celebraram um contrato de mandato.

 

Em termos jurídicos, diz-se outorgar um mandato, o que tem o mesmo significado do “passar uma procuração” ou “outorgar uma procuração”.

 

 

Quem pode dar procuração?

 

Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração através de instrumento particular ou público.

 

É exatamente nesse aspecto que a utilização da procuração nos casos de Alzheimer preocupa.

 

Como vimos no item que tratamos da capacidade das pessoas, o doente com doença de Alzheimer é tido como pessoa absolutamente incapaz perante a lei, já que não consegue exprimir sua vontade validamente, nem praticar os atos da vida civil. Desse modo, ele não pode outorgar procuração válida.

 

Entretanto, é a realidade, há muitos casos em que o doente com doença de Alzheimer comparece a um cartório e constitui um procurador para administrar seus negócios através de uma procuração pública, sem maiores problemas. Aos olhos da lei essa procuração é nula, pois o outorgante não está apto a expressar sua vontade, está ali apenas porque alguém o levou ou pediu que o fizesse. O doente com doença de Alzheimer muitas vezes nem entende o que está fazendo naquele cartório, muito menos a extensão dos efeitos do ato que está realizando.

 

 

O que é a procuração de plenos poderes?

 

A procuração de plenos poderes é a mais utilizada no caso de idosos: trata-se do mandato geral em que há outorga de todos os direitos que o mandante possui. Entretanto, esse mandato só confere poderes para a prática de atos de administração. Daí porque ele não é eficiente para efetuar a venda de um imóvel.

 

Para a venda de um imóvel é necessário mandato especial através de procuração específica que engloba determinados direitos, estando restrito aos atos e negócios expressamente especificados no texto da procuração.

 

É muito comum, também, que esse instrumento seja confundido com o mandato geral, uma vez que o mandato especial pode ser bem amplo. A diferença está no teor de ambos: no mandato geral não há a discriminação de qualquer negócio, já no específico, os negócios que poderão ser realizados estão discriminados um a um.

 

Para alienar (vender), hipotecar, transigir é necessário procuração com poderes especiais e expressos.

 

Vale dizer que os poderes do mandatário estão limitados aos atos relacionados na procuração.

 

Ambas as procurações devem ser lavradas junto ao Cartório de Títulos e Documentos.

 

 

Extinção do mandato

 

O mandato é válido até que uma dessas situações aconteça:

 

  1. a) O mandante revogar o mandato.
  2. b) O mandatário renunciar ao mandato.
  3. c) Morte do mandante ou do mandatário.
  4. d) Interdição do mandante.
  5. e) Interdição do mandatário.
  6. f) Mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes.
  7. g) Mudança de estado que inabilite o mandatário a exercer os poderes.
  8. h) Término do prazo estabelecido na procuração.
  9. i) Pela conclusão do negócio descrito na procuração.

 

Merecem destaque dessa lista os itens d) e f).

 

Note no item d) que todas as procurações outorgadas por uma pessoa interditada perdem a validade e o mandatário que a utiliza realiza negócio jurídico que pode vir a ser anulado posteriormente, podendo, inclusive ser responsabilizado civilmente pelos danos que causar (condenado a indenizar os prejuízos advindos da realização do negócio) se sabia da interdição do mandatário.

 

Quanto à mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes, isso identifica exatamente o que ocorre no caso da doença de Alzheimer, na qual a pessoa perde a consciência dos seus atos em decorrência da doença e torna-se absolutamente incapaz, sendo impossibilitada de dar procuração. Assim, não é necessário que a pessoa seja interditada para que a procuração perca sua validade, basta que o mandante se torne incapaz por qualquer motivo.

 

Vale dizer que, nos dois casos, o mandatário que realizar negócio em nome do mandante utilizando-se de procuração que sabe ter sido revogada pode ser responsabilizado pelos prejuízos que causar, podendo apenas concluir os negócios já iniciados.

 

A cláusula de irrevogabilidade é também bastante questionada pelas pessoas. Quando em uma procuração constar a cláusula de irrevogabilidade, não significa que o mandato jamais poderá ser revogado, mas sim que o mandante não poderá revogar o mandato.

 

 

Procuração ou interdição?

 

Acredito que, diante de todas estas informações, a resposta desta pergunta poderá ser facilmente encontrada.

 

Nos casos de doença de Alzheimer, em que a pessoa já perdeu a consciência de seus atos, e diga-se que já nas fases iniciais da doença esta condição pode ser verificada e se dá em decorrência dos lapsos de memória significativos, das confusões mentais e das alucinações, a procuração não é mais possível, inclusive a utilização de uma procuração já existente, pois ela será inválida.

 

Caso a família ou alguém próximo tenha conhecimento de que uma pessoa nessa situação tenha outorgado mandato a outra pessoa, sabendo seu nome ou onde encontrá-la, poderá notificá-la através de uma carta com protocolo (assinatura de recebimento), informando que o mandante foi acometido por doença incapacitante e que o mandato está revogado nos termos do Código Civil.

 

Caso a pessoa tenha sido diagnosticada com a doença de Alzheimer muito no início e ainda não tenha perdido a consciência dos seus atos, poderá outorgar mandato para terceira pessoa, entretanto este somente será válido até a pessoa doente tornar-se absolutamente incapaz.

 

Portanto, nos casos da doença de Alzheimer, a lei brasileira admite apenas a representação da pessoa através de um curador, não podendo ser representada por um procurador.

 

Muito embora todos saibam que na prática muitas pessoas utilizam-se da procuração para representar pessoas absolutamente incapazes, tal prática não é correta perante a lei, sendo que os negócios realizados através desse documento poderão ser anulados e a pessoa que o utilizou indevidamente poderá vir a ser responsabilizada pela indenização dos prejuízos eventualmente causados.

 

É sempre importante lembrar que após o ajuizamento da ação de interdição o patrimônio do interditando fica sob a proteção do judiciário, tendo em vista que toda ação no sentido de movimentar valores significativos dependerá de autorização do juiz. Isso torna toda ação muito lenta, seja a venda de um imóvel, seja o pagamento de uma dívida, por isso é importante que a família tome todas as providências necessárias no sentido de assegurar o sustento do paciente da doença de Alzheimer antes do ajuizamento da ação de interdição (por exemplo, caso necessite alienar um imóvel de grande valor econômico para adquirir dois de valor menor e que possam ser alugados mais facilmente, mantendo, assim, um rendimento extra para seu parente acometido pela doença).

 

Há casos, ainda, em que a pessoa, já com suas funções motoras debilitadas e com doença de Alzheimer, não possui patrimônio a ser administrado, não recebe pensão ou aposentadoria e vive sob os cuidados de um filho que tudo lhe provém: note que nessa situação a ação de interdição não terá grande utilidade, podendo ser perfeitamente dispensada.

 

Dessa feita, pode-se notar que cada caso guarda particularidades que deverão ser analisadas cuidadosamente para então se decidir pela interdição ou não do seu parente adoentado.

 

Fonte:

Por Flávia Celestino (ABRAZ)

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